economia da salvação

Páscoa. Ready-made. O costume. Gente que vai, alguma que não volta ou volta estropiada ou sincopática, enquanto há féria, folares e prevenção rodoviária, que a malta – mesmo a que se apegou às inanidades do Baudrillard e outros arautos da pós-modernidade que tão depressa rasuram a imagem como a respectiva inscrição – já não engole com facilidade a conversa do S. Paulo quando lá dos alvores da nossa teofania favorita retoricamente perguntava: Não sabeis que o vosso corpo é o templo do Espírito Santo e que vós já não vos pertenceis? Deus morto, Deus posto, o que trocado por miúdos e sonhos que prolongam a manhã para a tarde na horizontal do lugar é mais ou menos o mesmo que o regresso triunfal à carne e que se dane o terceiro dia e a contiguidade da divina proporção com a perdição. Troppo crudo, dir-se-á. Ele há coisas que não colam sem um enxerto – híbrido que seja – do bem e do mal e uma cortina corrida de modo a simular a twilight zone. Às vezes mas só às vezes sou levado a concordar. Veja-se o filme do dia, um Dreyer de dois palmos de trela e pergaminhos, com olhos de ver. Não é para estarrecer, que respondia a avatar institucional. Mas a custódia de Jupi-Pari virtuoso não impediu uma variação que pelo menos a mim faz baixar (pronunciadamente) a bolinha. Na techné e na ambiguidade. A cena da bifurcação da estrada que remata o oráculo atrai a filosofia da contingência que sequestra o nosso mundo hiper-secularizado, abrindo para um cepticismo radical – seja como for, estamos tramados. Se estivesse em maré de confidências, diria: volta, Deus, estás perdoado. E apressa-te. Mas não me quero meter em embrulhos escusados a instantes de me pôr a caminho de casa.


De nåede færgen [They Caught the Ferry], Carl Th. Dreyer, 1948

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