culpa

Hände, 1963
Gerhard Richter
Esta noite enquanto me fechava da vida, módico, sonhei. O fogo do Senhor rondava as minhas mãos. Infectas. Com a esquerda, trémula, escrevia: to serve and obey Thee. On my hands the iniquity and the frailty of us all. Acordei, sem sacão mas assustado. As mãos doíam-me e pareceram-me inchadas, como se tivesse dado uso feroz aos punhos sem a protecção das luvas almofadadas dos pugilistas, sem dono. Vocalizei o fragmento pio. Do timbre que ouvi vi-me nos sete anos, desamparado, clandestinamente infeliz. Gemi, parecido a uivo, da pulsão de abrigo que precedera. Concessão breve. Desci da cama para o chão do quarto e detive-me na Razão que atormenta a consciência. Os monólogos da restauração revoltam-me. Como a celebração da amenidade, a expiação programada, o desejo de aplauso, a forma altiva da bondade, a supremacia do animal sensível, a fatalidade da Morte. É tarde demais para cotejar a Infância e o Direito Humano.